Era ela... Era quase ela...

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Era ela... Era quase ela...
Com seu cabelinho branco, levemente acinzentado, já com o permanente mais soltinho, uma saia pelo joelho, da mesma cor bege - a saia de sair - e o casaquinho branco, com camisa branca por baixo... Era minha avó, com um detalhe que na hora foi esquecido, minha avó já não vive e eu estou na Hungria, no centro de Pécs...
Tem certos momentos que me fazem esquecer completamente do tempo e do espaço, como uma viagem no tempo, que destrói fronteiras, distâncias, acontecimentos que não têm mais volta... Esse foi um momento assim, minha avó estava parada na multidão, há cinco passos de mim. Meu coração disparou e sem pensar, uma felicidade tomou conta da minha alma: Ela está aqui!
Mas foram milésimos de segundos até eu me lembrar de tudo, até lembrar que não podia ser e até ver o rosto da senhora que resolveu se vestir para me confundir. Como podia ela ter a mesma roupa? O mesmo cabelo? A vontade de abraçar aquela mulher era tão grande que tive que me segurar. Mas eu não podia abraçá-la, quebraria o encanto, como se qualquer movimento meu fosse fazer tudo desaparecer e eu não queria, queria matar a saudade e olhar mais um pouco, o quanto pudesse, fingir que ela estava ali, um pouco a frente, como se passeássemos juntas na cidade e ela estivesse esperando que eu levantásse-me da mesa onde estava para continuarmos juntas.
Meu marido e meus filhos tomavam sorvete e brincavam na mesa do café onde estávamos sentados, um sol gostoso tomava toda a praça central, com uma leve brisa e havia muitas pessoas, a cidade estava em festa, com feirinhas por todos os lados, crianças brincando com balões brancos e gritando, correndo, rindo. Eu não sei quanto tempo durou, como eu disse, o tempo parou, as pessoas pararam e eu fiquei ali, olhando para minha avó, tentando não olhar para o rosto diferente daquela senhora, mas em todo resto tão igual. Imaginei se eu a abraçasse e ela retribuísse com aquele abraço longo e com balanço que costumávamos dar, se ela teria o mesmo cheiro de Nívea com perfume suave de lavanda, se riria ao meu ouvido me chamando de "fia"... E ela estava ali parada, como que esperando que eu me lembrasse de tudo isso e em pensamentos revivesse tudo o que a saudade me guardava daquele tempo em que podia grudar abraçada nela durante horas. Imaginei se ela me contaria outra vez as suas histórias, como aquela de quando meu vô tentou ensiná-la a andar de bicicleta e eles caíam propositalmente para poderem se abraçar...
E como mágica, como eu previra e sabia que seria, num piscar de olhos ela sumiu na multidão.
Meus olhos se encheram d'água e lágrimas rolaram silenciosas por meu rosto, caindo rapidamente num rio de saudades, que nascia do meu coração, daquele lugar onde estava tudo guardadinho para não apertá-lo constantemente e transbordava com toda a dimensão tomada pela máquina do tempo da coincidência. Mas eu ainda segurava o choro, até o momento que olhei para meu marido, que me observava com cara de interrogação, meio que preocupado com as lágrimas surgidas do nada e pronunciei a frase que soltaria todo o soluço do choro contido:
-Ela era tão parecida! - E o choro saiu, soluçado e desenfreado.
Meu marido me abraçou e sugeriu que eu fosse para perto dela, que fosse atrás e pedisse um abraço, mas eu não queria estragar as últimas lembranças, do abraço que eu dei em pensamento, do cheiro e do seu último riso ao meu ouvido. Foi minha despedida imaginária, o último beijo que deixei de dar quando não me deixaram entrar na UTI. Afinal, nada é por acaso. Nunca na minha vida vi alguém se parecer com minha avó, nem no Brasil, fui encontrá-la na Hungria... Explicação eu não quero, não quero ser cética, apenas desejo imaginar que algo mágico aconteceu, que viajei no tempo e que o mundo parou para que aquele abraço acontecesse, bem do jeito que tinha que ser, perfeito.
Agora sei que estava errada, você vive, dentro de mim vive tudo o que era seu, o perfume, o toque, o som... Saudades, minha querida!







COMENTÁRIOS AQUI!:


Mamãe Livia Says: 
Nossa, Carol, fiquei emocionada, to aqui enxugando as lágrimas. Também lembrei da minha avó, mas a minha sorte é que ela está vivinha no Brasil, e se Deus quiser eu vou vê-la em Novembro. Mas a saudade sempre aperta, não sei se um dia vou conseguir lidar bem com isso...
Um beijo e parabéns pelo post! Aliás, adoro os seus posts, leio sempre o seu blog (embora muitas vezes eu passe aqui correndo e não dê tempo de comentar sempre).
Livia
viagensdeumamaedeprimeiraviagem.blogspot.com
Ingrid Souza Says: 
As vezes eu acho que a Hungria é mágica sabe ou se é minha saudade que aperta cada vez que estou ai, mas fato é que foram inumeras as vezes que vi velhinhos que lembravam meus avós, a ultima foi em maio, lembra, até escrevi pra vc sobre isso, um senhorzinho no mercado que me levou as lágrimas.
A minha avó hungara não lembra em nada minha avó brasileira fisicamente, mas o amor e o carinho com o qual me abraça e sorri pra mim me lembra minha avó Maria, que ja se foi faz seis anos mas com certeza olha por nós. =)

Um beijo querida, e acredite, sua vó ainda olha pela "fia" dela.
Lu Says: 
Ai, me arrepiei e chorei. Também não tentaria buscar explicações, apensar curtiria a fantasia, o momento, as saudades...

beijos!
Carol Says: 
Lívia,
Fico muito muito feliz em saber que vc lê o meu blog. 
Pois é, vó é complicado, né? A gente sabe que não é pra sempre, porque são mais velhas, mas nunca se prepara o suficiente para não tê-las. Minha avó era minha queridinha, vivia com ela antes de mudar de país... A gente se conforma, mas a saudade sempre vai apertar...
Curta muito a sua em novembro, abrace muito!
Beijinhos!
Carol Says: 
Ingrid, não vale me fazer chorar com comentários... ahahahha Mas acho que vc tem razão, tem certa magia aqui sim, embora sejam tão diferentes dos brasileiros, as vezes juro ver alguém de lá. Lembro desse senhorzinho que vc falou sim. Mas essas surpresas emocionam porque é muito bom o sentimento que trazem, não é? Sim, eu tb acredito que ela está olhando por mim e agora deve estar toda cheia com o texto dela... rsrsrs
Beijinhos querida!
Carol Says: 
Lu,
é isso mesmo, a mágica sempre perde a graça quando a gente descobre o porque de tudo, sou daquelas que odeia saber os truques e que adora pensar que papai noel é de verdade. A magia deixa a vida tão mais linda e pura...
Beijinhos!
Yohana SanFer Says: 
Lindo e lindo Carol...poderia ser um lindo conto se não fosse uma pura e incrível arte da alma camuflada de emoção e lembrança. A saudade retratada de uma experiência mágica e intensa...haja coração hein! Com episódios lindos como este é que nos damos conta do que se trata o tal fato de que tudo é possível quando amamos alguém! Fiquei feliz ao ler! bjs moça!
Carol Says: 
Que lindo Yohana!
Não tinha pensado como um conto, realmente daria um... :) Adoro essas surpresas que minha imaginação fértil e sonhadora produz... 
Que bom que você ficou feliz!
Beijinhos!
Anônimo Says: 
Vou te falar...... abri a página e vi a foto da Vó... nem comecei a ler o texto e meus olhos encheram de lágrimas, então achei melhor ler fora da loja, senão já viu né... já sei até qual vai ser minha resposta na enquete! Ordinária... rsrs Logo eu leio e daí escrevo de novo.... Beijos querida!
Juliana
Carol Says: 
Aahahahhahhaha Só você mesmo Ju. ahahahah
Anônimo Says: 
Oi Amor!
Foi uma experiencia unica para mim esse encontro sua com a velhinha. Estava dando sorvete para os meninos, quando olhei pro lado, vi voce com aqueles olhos tao fundos que jamais vi. Sei ... alias acho que sei o quanto Ela foi importante para Voce e marcou sua vida, ajudou voce ser que voce hoje é.
Mais uma vez voce mostrou o copo meio cheio ! :) 
Incrivel! Te Amo!
Continue... sempre
Zsombor
Carol Says: 
É amor, você já me conhece mais que eu mesma, não é? Você sabia na mesma hora do que se tratava sem nem mesmo eu te explicar... Obrigada por sempre fazer e dizer a coisa certa.
Te amo!
Anônimo Says: 
Caro!
Esse texto me calou!!!! Nem consigo comentar...mas adorei, como todos!
Bjão!
Mariana
Celi Says: 
Carol,
Que gostoso que é reviver um momento do passado. Um encanto! Uma bela lembrança! Uma magia!
A vida é feita de boas lembranças e que maravilha esse momento que lembrou da sua avó. Cada detalhe inesquecível.
Fiquei emocionada com seu texto. Realmente imaginei a situação e chorei junto com você.
Beijos
Carol Says: 
Ma, que bom que vc gostou...
vc a conheceu, vc imagina bem o que contei no texto... Não é fácil não é?
Beijinhos!
Carol Says: 
Celi, que bom que consegui descrever bem o que senti. Foi mesmo um momento que não imaginei viver, mas que bom que aconteceu...
Beijinhos!
Anamaria Says: 
Querida Carol,teus textos sempre vindo cheio de emoção e sentimentos,e tudo bastante verdadeiro. Fluindo daí da Hungria aqui pro Brasil, e sabe lá pra onde mais no mundo. Emocionante,mesmo. Vivi algo parecido há um ano atrás,meu professor de história,era exatamente como meu pai,até no jeito de falar.Imaginas como era ver ele toda semana? Momentos mágicos assim nos dão um friozinho na barriga com vontade de que tudo seja mesmo real,ou que só dure aquele tempinho,pra que seja marcado pra sempre. Parabéns,ótimo texto, como sempre
Carol Says: 
Aninha, imagino como devia ser pra vc, vê-lo toda semana... haja coração!!! Mas é isso mesmo, um pouco de magia não faz mal a ninguém, pelo contrário, fortalece o coração... :)
Beijinhos!
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