Alta noite, longa noite essa, da sua volta
para a Hungria. Estamos destinados a essas pequenas separações.
O relógio parou sem notícias suas, mas os
ventos, do lado de fora da minha janela, passam tão rápidos que parecem
lamentos de saudades e soam por volta da casa a te procurar, como se não
soubessem que você não está. O frio instalou-se de repente e eu sei que isso
vem da falta do seu abraço quente e dos seus apertões que me fazem rir com sua
justificativa: “O amor às vezes dói”.
É sempre difícil deixar-te, mesmo estando
feliz com a decisão.
Sim, eu decidi vir ao Brasil por dois meses
e fiquei extremamente feliz e satisfeita com sua proposta de vir comigo e
acompanhar-me em apenas duas semanas, eu sei... Mas hoje eu quero o direito de
sentir-me insatisfeita com sua falta, o direito de reclamar pela cama grande e
atribuir o uivo dos ventos ao meu pranto sem lágrimas, que sai varrendo os céus
até você. Só hoje.
Só hoje eu quero ficar brava com essa nossa
sina de despedidas e saudades. Só hoje quero ser uma chata e reclamar do
destino, justo eu, que tenho você, quero ser injusta como criança mimada
dizendo que é uma tremenda falta de sorte todo esse tempo desperdiçado com sua
ausência.
Amanhã eu lembrarei que estou curtindo meu
país e minha família. Amanhã lembrarei que a saudade vai fazer de nós um casal
de namorados apaixonados e que só por isso já vai valer a pena. Mas não hoje!
Hoje sou a metade vazia, sou o vento
uivante, a noite negra, fria e demorada. Sou filha desnaturada do destino. Só
hoje.